Qual o impacto de boas práticas de gestão de dados na educação ambiental?

Porque é necessário o planeamento desde o início do processo de investigação?

Quais são os maiores desafios para garantir a sustentabilidade e interoperabilidade dos dados a longo prazo? 

DESCRIÇÃO

O CIIMAR Watch é um programa institucional de monitorização marinha e ambiental da costa norte de Portugal, desenvolvido pelo Centro de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR). 

A iniciativa integra esforços anteriores de monitorização realizados por diferentes grupos de investigação, promovendo uma abordagem colaborativa e interdisciplinar. O programa abrange observatórios no Porto e Viana do Castelo, monitorizando ecossistemas costeiros e estuarinos, incluindo os rios Douro e Lima. Os dados recolhidos são de natureza química, física e biológica, com o objetivo de gerar conhecimento científico robusto, apoiar decisões políticas e promover sensibilização pública e educação ambiental.

O programa tem como principais objetivos estabelecer linhas de base científicas, acompanhar a dinâmica ambiental em ecossistemas costeiros e estuarinos e fornecer dados contínuos, de longo prazo, gratuitos e de acesso livre a cientistas, comunidades locais e decisores. A sua abordagem é interdisciplinar, combinando competências de investigadores em oceanografia física, climatologia, química ambiental, deteção remota, toxicologia ambiental, ecologia microbiana, ecologia bentónica e pelágica, ecologia de mamíferos marinhos e biodiversidade. Esta perspetiva holística permite uma visão abrangente de uma região marcada por processos complexos e em constante transformação.

O impacto esperado do programa traduz-se na melhoria da compreensão dos ambientes marinhos, no apoio a políticas públicas de conservação e gestão ambiental e na promoção da ciência aberta, assegurando que os dados recolhidos sejam disponibilizados de forma contínua e acessível à comunidade científica e à sociedade em geral.

TRÊS LIÇÕES APRENDIDAS

Valor da colaboração interdisciplinar

A experiência demonstrou que a integração de diferentes áreas científicas — incluindo biologia, química, oceanografia e monitorização de cetáceos — constitui um fator determinante para a robustez e abrangência dos resultados obtidos. A colaboração interdisciplinar permite que variáveis distintas sejam analisadas em conjunto, oferecendo uma visão holística dos ecossistemas e aumentando a capacidade de resposta a questões ambientais complexas. Ao reunir especialistas com formações diversas, promove-se não apenas a complementaridade de competências, mas também a criação de sinergias que potenciam a inovação científica e a produção de conhecimento mais sólido. Esta abordagem integrada contribui para que os resultados não se limitem a perspetivas isoladas, mas reflitam a complexidade real dos sistemas naturais, tornando-os mais relevantes para a comunidade científica, para os decisores políticos e para a sociedade em geral.

Importância da estandardização de protocolos

A harmonização metodológica foi reconhecida como uma componente essencial para assegurar a transparência e a credibilidade da investigação.

Este processo de estandardização, está a ser adaptado ao contexto do CIIMAR WATCH, garantindo que os dados recolhidos sejam comparáveis entre diferentes equipas e interoperáveis em cenários nacionais e internacionais.

Planeamento estratégico da gestão de dados desde o início

A definição de planos de gestão de dados estruturados desde a fase inicial dos projetos foi reconhecida a nível institucional como essencial para garantir a credibilidade científica e a sustentabilidade da informação a longo prazo, implicando a integração de uma pessoa dedicada a este processo. Um planeamento estratégico desde o início permite antecipar necessidades, identificar potenciais desafios e estabelecer mecanismos claros para a recolha, armazenamento, documentação, preservação e disponibilização dos dados.

TRÊS DESAFIOS FUTUROS

Garantia da qualidade e interoperabilidade de dados históricos

A integração de séries temporais anteriores constitui um dos maiores desafios na gestão de dados ambientais e científicos. A recolha de dados realizada em diferentes períodos, por distintos grupos de investigação e com metodologias diversas, exige um esforço significativo de harmonização. É necessário superar discrepâncias nos métodos de amostragem, nos instrumentos utilizados e nos formatos de registo, assegurando consistência e comparabilidade. A qualidade dos dados históricos deve ser cuidadosamente verificada, de modo a garantir que possam ser integrados em bases de dados atuais sem comprometer a fiabilidade das análises. A interoperabilidade, por sua vez, implica que estes dados sejam estruturados e documentados de forma a permitir a sua reutilização em contextos nacionais e internacionais, reforçando o valor científico das séries temporais e ampliando o seu impacto na investigação e na tomada de decisão.

Sustentabilidade a longo prazo

A continuidade e fiabilidade dos dados dependem da existência de recursos técnicos, humanos e financeiros estáveis. A sustentabilidade a longo prazo exige não apenas financiamento adequado, mas também a criação de estruturas organizacionais que assegurem a manutenção das plataformas de recolha, armazenamento e disponibilização de dados. A formação contínua de profissionais especializados, como data stewards e técnicos de monitorização, é igualmente essencial para garantir que as práticas de gestão de dados evoluam em consonância com os avanços tecnológicos e científicos. Além disso, a sustentabilidade implica a definição de estratégias institucionais que assegurem a preservação da informação ao longo do tempo, evitando perdas e assegurando que os dados permaneçam acessíveis e utilizáveis para futuras gerações de investigadores e decisores.

Implementação de sistemas avançados de disponibilização

O desenvolvimento de plataformas tecnológicas que permitam o acesso em tempo real a dados ambientais representa um desafio tanto tecnológico como organizacional. A criação de sistemas geográficos interativos, capazes de disponibilizar mapas, séries temporais e indicadores atualizados, exige investimentos em infraestrutura digital, interoperabilidade de sistemas e segurança da informação. Estes sistemas devem ser concebidos para servir múltiplos públicos: investigadores, decisores políticos, gestores ambientais e cidadãos interessados. A disponibilização avançada de dados não só aumenta a transparência e a credibilidade da investigação, como também promove a ciência aberta e o envolvimento da sociedade na conservação ambiental. Contudo, a implementação destes sistemas requer coordenação institucional, definição clara de responsabilidades e integração de diferentes competências técnicas, assegurando que a informação seja não apenas acessível, mas também compreensível e útil para os diversos utilizadores.

CINCO QUESTÕES SOBRE GDI

Como define, implementa e avalia as práticas de gestão de dados de investigação?

A implementação das práticas de gestão de dados assenta em várias dimensões complementares. Em primeiro lugar, destaca-se a designação de data stewards e coordenadores de qualidade por habitat, assegurando que cada área de monitorização dispõe de responsáveis dedicados à verificação e harmonização dos dados. Este modelo descentralizado permite maior proximidade às especificidades de cada ecossistema e garante consistência metodológica. Paralelamente, procede-se à criação de protocolos estandardizados e guias de boas práticas, que funcionam como referenciais comuns para todos os grupos de investigação envolvidos. Estes documentos são fundamentais para assegurar transparência, comparabilidade e interoperabilidade dos dados. A implementação inclui ainda a estruturação de planos de gestão de dados institucionais, concebidos como instrumentos estratégicos que orientam todo o ciclo de vida da informação científica. Finalmente, a formação e sensibilização de investigadores para ciência aberta constitui um eixo central, promovendo a adoção de práticas responsáveis e sustentáveis de gestão de dados e incentivando a partilha em conformidade com os princípios FAIR.

A avaliação destas práticas é realizada através de diferentes mecanismos. São conduzidas entrevistas qualitativas a investigadores, que permitem identificar lacunas, padrões e necessidades específicas em cada área científica. A produção de outputs académicos, como teses e relatórios, contribui para caracterizar de forma sistemática as práticas existentes e para documentar os desafios enfrentados. Adicionalmente, recorre-se ao benchmarking com programas europeus e internacionais de referência, assegurando que as práticas locais se alinham com padrões globais e beneficiam da experiência acumulada em iniciativas semelhantes.

Quais os principais benefícios dessas práticas?

A adoção de práticas estruturadas de gestão de dados científicos gera um conjunto de benefícios que se refletem em diferentes dimensões da investigação e da sociedade. Em primeiro lugar, promove transparência e credibilidade científica, assegurando que os processos de recolha, tratamento e disponibilização da informação são claros, verificáveis e replicáveis. Esta transparência reforça a confiança da comunidade académica e dos stakeholders externos, incluindo decisores políticos, financiadores e cidadãos, que passam a reconhecer o valor e a fiabilidade dos resultados produzidos.

Um segundo benefício prende-se com a interoperabilidade e reutilização dos dados em múltiplos contextos. Ao serem estruturados e documentados de acordo com normas e protocolos estandardizados, os dados tornam-se comparáveis entre diferentes projetos e instituições, aumentando significativamente o seu valor científico. Esta capacidade de reutilização potencia novas análises, reduz redundâncias e amplia o impacto da informação, permitindo que os mesmos dados sirvam de base a investigações diversas e complementares.

Estas práticas apoiam também de forma direta políticas públicas e iniciativas de conservação ambiental, fornecendo informação fiável e atualizada para a tomada de decisão. A disponibilização de dados robustos e acessíveis contribui para que gestores ambientais e decisores políticos possam fundamentar estratégias de conservação, mitigação de impactos e gestão sustentável dos recursos naturais.

Por fim, a adoção de práticas de gestão de dados promove uma maior sensibilização e envolvimento da comunidade científica e educativa, fomentando uma cultura de responsabilidade e partilha. Investigadores, estudantes e instituições passam a reconhecer que os dados não são apenas recursos individuais, mas património coletivo que deve ser preservado e disponibilizado em conformidade com os princípios da ciência aberta. Esta cultura fortalece a cooperação interdisciplinar, estimula a formação de novas gerações de cientistas conscientes da importância da gestão responsável da informação e contribui para aproximar a ciência da sociedade.

Em que medida a gestão de dados de investigação contribui para a otimização do processo de investigação?

A gestão estruturada de dados exerce um impacto direto e significativo na otimização dos processos de investigação científica. Em primeiro lugar, permite a redução de redundâncias e inconsistências, assegurando maior eficiência na utilização da informação. Quando os dados são recolhidos, armazenados e documentados de forma sistemática, evita-se a duplicação de esforços e minimizam-se erros que poderiam comprometer a qualidade das análises. Esta racionalização traduz-se em ganhos de tempo e recursos, aumentando a produtividade das equipas de investigação.

Outro contributo relevante é a aceleração da produção científica e de relatórios ambientais. A organização e acessibilidade dos dados facilitam a elaboração de artigos, relatórios técnicos e documentos de apoio à gestão ambiental, permitindo que os investigadores respondam de forma mais célere às exigências da comunidade científica e dos decisores políticos. A disponibilidade imediata da informação torna os processos de análise mais ágeis e reduz os obstáculos associados à recolha dispersa ou desorganizada de dados.

A gestão estruturada de dados potencia também a integração de variáveis multidisciplinares, tornando mais simples a realização de análises abrangentes e inovadoras. A combinação de dados provenientes de diferentes áreas científicas — como biologia, química, oceanografia ou climatologia — permite construir modelos mais completos e responder a questões complexas com maior rigor. Esta integração interdisciplinar fortalece a capacidade de gerar conhecimento novo e relevante, ampliando o alcance e a aplicabilidade dos resultados.

Finalmente, estas práticas promovem a melhoria da fiabilidade e comparabilidade dos resultados, aumentando a robustez das conclusões científicas e a sua relevância internacional. Dados bem estruturados e documentados podem ser comparados com séries temporais de outros programas ou instituições, permitindo validar hipóteses e reforçar a credibilidade das investigações. A comparabilidade assegura que os resultados obtidos localmente possam ser integrados em redes internacionais de monitorização, ampliando o impacto da investigação e consolidando o papel das instituições envolvidas no panorama científico global.

Que vantagens e condicionantes aponta na partilha de dados de investigação?

Entre as principais vantagens da adoção de práticas estruturadas de gestão de dados, destaca-se a robustez científica que resulta da integração de diferentes áreas de conhecimento. A interdisciplinaridade, ao reunir contributos de domínios como biologia, química, oceanografia e ciências ambientais, permite análises mais completas e rigorosas, capazes de responder a questões complexas com maior profundidade. Esta diversidade metodológica e conceptual fortalece a qualidade dos resultados e amplia a sua relevância para a comunidade científica e para a sociedade.

A gestão estruturada de dados confere também credibilidade junto de decisores políticos e financiadores, demonstrando que os projetos seguem práticas rigorosas, transparentes e alinhadas com padrões internacionais. Essa credibilidade reforça o impacto institucional e aumenta a capacidade de atrair recursos, sejam eles financeiros, técnicos ou humanos. Acresce ainda a maior visibilidade e impacto institucional, posicionando a organização como referência na área da ciência aberta e da monitorização ambiental. A disponibilização de dados de forma transparente e reutilizável contribui para consolidar a reputação da instituição e para fortalecer a sua integração em redes científicas nacionais e internacionais.

Contudo, existem condicionantes que não podem ser ignoradas. A implementação destas práticas requer recursos humanos especializados, cuja formação contínua e retenção constituem desafios permanentes. A complexidade logística e tecnológica associada à recolha, armazenamento e disponibilização de dados exige investimentos constantes em infraestrutura digital, equipamentos e sistemas de suporte, garantindo que a informação seja preservada e acessível a longo prazo. Por fim, a eficácia do sistema depende da adesão voluntária e colaborativa dos grupos de investigação, o que implica um esforço contínuo de sensibilização, coordenação e alinhamento de práticas. Sem este compromisso coletivo, torna-se difícil assegurar a consistência e a interoperabilidade dos dados, limitando o potencial da gestão estruturada.

De que forma os diferentes atores envolvidos no processo de investigação estão comprometidos com a gestão de dados de investigação?

O sucesso das práticas de gestão de dados científicos depende de uma atuação articulada e complementar entre diferentes atores institucionais e sociais. Cada grupo desempenha funções específicas que, em conjunto, asseguram a qualidade, a sustentabilidade e o impacto da informação produzida.

Os investigadores constituem a base do processo, sendo responsáveis pela recolha e disponibilização dos dados. A sua participação ativa nos protocolos definidos e nas ações de formação é essencial para garantir que a informação gerada cumpre padrões de qualidade e se encontra devidamente documentada. Ao adotar práticas harmonizadas, os investigadores contribuem para que os dados sejam comparáveis e reutilizáveis, reforçando a credibilidade da investigação.

Os data stewards desempenham um papel central na coordenação da gestão de dados. Cabe-lhes verificar a qualidade da informação, assegurar a conformidade com protocolos estandardizados e promover a harmonização metodológica entre diferentes grupos de investigação. A sua função garante que os dados não apenas são recolhidos, mas também estruturados e preservados de forma adequada, permitindo a sua utilização a longo prazo.

A coordenação científica assume a responsabilidade de definir prioridades estratégicas e supervisionar a integração interdisciplinar. Este nível de coordenação assegura que os objetivos do programa são claros e que os diferentes contributos científicos convergem para resultados robustos e relevantes. A supervisão interdisciplinar é particularmente importante em programas que envolvem múltiplas áreas de conhecimento, garantindo coerência e consistência na produção científica.

A instituição desempenha um papel de suporte fundamental, fornecendo recursos logísticos, financeiros e organizacionais. É a instituição que cria as condições para a sustentabilidade das práticas de gestão de dados, assegurando que existem meios técnicos e humanos adequados para manter a continuidade do programa. O seu compromisso institucional é determinante para que a gestão de dados seja reconhecida como um eixo estratégico e não apenas como uma atividade acessória.

Os estudantes e a comunidade científica participam em projetos de formação e sensibilização, contribuindo para a disseminação de boas práticas. A sua integração nos processos de gestão de dados promove a renovação de competências e garante que novas gerações de investigadores estão preparadas para lidar com os desafios da ciência aberta e da gestão responsável da informação.

Finalmente, os stakeholders externos, incluindo decisores políticos e sociedade civil, desempenham um papel crucial na valorização e aplicação dos dados. Ao utilizarem a informação científica para fundamentar decisões e promover a conservação ambiental, reforçam o impacto social da investigação. A ligação entre ciência e sociedade é fortalecida quando os dados são disponibilizados de forma transparente e acessível, permitindo que sejam utilizados para enfrentar desafios ambientais e apoiar políticas públicas.